29 novembro 2007

Centrão Vinte e Quatro Horas

Paulistano que é paulistano tem uma paixão estranha pelo centro da cidade. Cada um tem seu buraco preferido. Quem gosta de motos vai na rua General Osório, os que procuram aparelhos eletrônicos procuram pelas lojas da Santa Efigênia, produtos baratos é na Galeria Pagé, roupas na José Paulino, bugigangas chino-paraguaias na 25 de Março, vestidos de noiva na São Caetano, boates na Rua Augusta, viadagem na Vitória, equipamentos fotográficos na 7 de Abril, loucos com uma Bíblia na mão na Praça da Sé, e crianças cheirando cola tem em todos os cantos, principalmente se você freqüentar a região da Luz, a famosa cracolândia, onde a cola é "só pra tirar a lombra da pedra, tio". O Centrão é para todos. Ô lugarzinho democrático aquele. Mas um pedacinho ali chama a atenção. É lá onde o dedo na cara da sociedade e a religião convivem numa boa. Se fosse nos anos 70, hippies brasilis diriam "convivem numa nice". A putaria e o padre rezam a mesma missa num quadrilátero formado pelas Avenidas São João e Ipiranga, rua Boticário e Largo do Paissandu, que quase virou Paiçandu um tempinho atrás. Se da para definir sexo de alto nível e baixo nível, ali se encontra o mais podre dos níveis. A conivência entre trabalhador e batedor de carteira, idosos e crianças, coreanos e africanos, é algo para ser estudado, porque, no esgoto dos esgotos, ninguém teme ninguém. Essa é a lei do Centrão. Todo mundo ali é esquisito pra cacete, então um não mexe com o outro. Mas ali no quadrilátero da putaria a luz do dia, é que as coisas fluem numa paz inimaginável. Se colocassem judeus e palestinos por ali, tudo correria na tranqüilidade ou, melhor dizendo "numa nice". São duas da tarde e placa do Cine Las Vegas, no começo da São João, onde desce pro Anhangabaú, grita aos meus olhos "24 horas de sexo ininterruptos. Dois cinemas pelo preço de um. Apenas R$ 6,00". Em cartaz Histórias de uma Gueixa, e Habuki - Lady Boys, provavelmente um clássico do cinema transexual. Acreditei que ali era o melhor da região, mas era só o começo. Mais adiante, seguindo pela São João, um rapaz aos berros anunciava que ali "só mulher bonita, e estão todas nuas. Não precisa pagar pra entrar, só consome se quiser". Era o hostess do Castelão Drink´s Show vendendo o que de melhor havia em termos de sexo. Claro que ele escondia esse fato. "Aqui é casa de shows", disse o hostess. Ao lado do Castelão Drink´s estava a sensação dos cinemas pornôs do centro de São Paulo. Até no nome exalava a superioridade sobre os outros cines. O Cineart Palácio é a meca dos tarados. Com três salas e dez filmes reúne cinco tarados a cada quinze minutos. "Os Melhores Filmes. O maior Cinema. Pelo Menor Preço" é o chamativo do Palácio. Nenhum marqueteiro pensaria num slogan mais apropriado. A meca dos filmes pornôs não pára por ai. Se você é daqueles não muito sociáveis, e gosta de curtir um filminho sozinho (mas não tão sozinho assim), eles oferecem cabines individuais com ar-condicionado para seu melhor prazer. O problema é o tempo, apenas cinco minutos para satisfazer qualquer tipo de necessidade que você tenha naquele momento. Bom, é Um Real apenas. Mas nenhum desses cinemas é como o Cine Windsor, na esquina da avenida Ipiranga com a rua Boticário. Eles tem "a melhor projeção da cidade" (ah, se o Cinemark sabe disso), e o menor preço. R$ 5,00 e ainda aceitam carteirinha. Para assistir Anal Total Volume 11, nada melhor que um desconto.
Atrás do padre tem um psiu, psiu
O último sinal do final da vida humana na Terra, segundo a igreja católica, é a chegada dos sete cavaleiros do apocalipse. È justamente num dos recantos do Senhor que eles estão. Logo ali atrás da Igreja de Nossa Senhora do Rosário, no Largo do Paissandu. Sim, os cavaleiros são fêmeas, e cobram R$ 50,00 por 40 minutos de sexo, e atendem pelos nomes angelicais de Scheila, Alicia, Bianca, Paty, Kátia, Keila e Francine. Todas têm um sofrimento estampado no rosto, não sei dizer o que significa. Mas entre um bom samaritano e outro que entra na igreja, e os transeuntes que por ali circulam, as sete cavaleiras emitem um som que arrebanha mais fiéis que missa de ação de graças. "Psiu, Psiu!", chamam, "vamos fazer um programinha gostoso?", perguntam com um ar sereno, quase angelical. Mas aquela expressão sofrida dá pena, e uma vontade de dar gorjeta, apenas para elas saírem dali. O Centrão é para todos!
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Por Luiz Filho - Guia de moteis

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